Diva
Clichê
sentimental funciona bem nesse “perfil de mulher”
Segunda entre as narrativas que José de Alencar chamou
“perfis de mulher”, Diva (1864)
segue-se nessa linhagem a Lucíola e
antecede Senhora. Esses três livros,
juntamente com os três romances indianistas, são o cerne da contribuição do
autor à ficção brasileira. Alencar tinha a cultura e o talento necessários à
tarefa de tornar o romance brasileiro comparável ao de outras literaturas; até
superior, se considerarmos a sensaboria que é o Werther de Goethe. Não tinha, é claro, o gênio de Machado de Assis
ou a ousadia de Manuel Antônio de Almeida.
O romance consegue ser interessante mesmo atendo-se
ao clichê dos clichês: um namoro em que tanto o rapaz quanto a moça sintetizam
o ideal burguês. O que envolve, naturalmente, a castidade. Em Lucíola, o fato de a protagonista ser
uma prostituta é compensado por seu martírio, que estraga uma narrativa cujas
grandes qualidades estavam justamente em antecipar, no retrato social e
psicológico, o Realismo.
Excetuando a tese de que mulher é um bicho
esquisito, temos em Diva o Romantismo
galopante. A nobreza do caráter de Augusto já fica indicada desde o nome. Pudera:
ele mesmo é o narrador, estruturando-se o romance como carta dirigida a um
amigo – o mesmo Paulo de Lucíola.
Ambos têm em comum, por sinal, a pusilanimidade que realça o caráter marcante
das heroínas.
O título refere-se a Emília, linda e inteligente
filha de um rico comerciante estabelecido na Corte. Diva quer dizer "divina", e o adjetivo
resume as altas qualidades da moça. Toda a complicação do enredo está no
comportamento contraditório de Mila (para os íntimos). Salva pelo narrador, aos 14
anos, de uma pneumonia – é o que parece –, tinha a famosa “deselegância discreta” depois atribuída às adolescentes.
Mais do que isso, na opinião de Augusto ela era bem desgraciosa, além de seu
pudor exagerado impedir o competente exame médico.
Augusto, recém-diplomado, viaja à Europa e toma o devido banho de
cultura. Mas o enredo, restrito à peripécia amorosa, mal toca nisso. Quando volta,
o rapaz encontra Mila transformada na mais linda moça da sociedade fluminense.
Com muito custo, ela desce de seu pedestal para dar alguma atenção a ele.
Quando Augusto se reconhece apaixonado, ela passa a rejeitá-lo e a humilhá-lo
em público, mas em particular lhe promete um possível amor do qual ele
deveria mostrar-se, mais do que digno, devoto. Que enjoada, né?
Tendo conseguido alguns encontros com a “deusa”,
afinal o narrador se agasta com os incoerentes negaceios e resolve tratá-la com
aspereza. É quanto basta para Emília declarar que o ama, e a receita está
completa.
Eloésio Paulo Instagram: @eloesiopaulo
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