A viuvinha


Bom lugar para estudar os rudimentos da forma narrativa


A fórmula é a do folhetim, com suas surpresas óbvias salpicando o enredo. Mas o escritor José de Alencar ainda não tinha desenvolvido aquela sua invencível prolixidade. Por isso A viuvinha (1857), publicado no mesmo ano que O guarani, está mais para as dimensões e o andamento de Cinco minutos (1856), conquanto lhe seja ainda inferior.
O narrador é o mesmo daquele livro inicial de Alencar. A destinatária também é sua prima, a quem ele escreve mais uma longa carta, desta vez contando a história de Jorge e Carolina. O enredo poderia até surpreender, caso o escritor dispusesse da retórica necessária e soubesse dosar o tempo narrativo de modo a não precipitar os fatos. Mas o livro vai mesmo aos atropelos, tanto que entre o final do capítulo 9º e o início do 10º se passam subitamente cinco anos, assim como do transcurso de outro ano se dá conta em apenas uma linha do capítulo XV.
O drama desse casalzinho lembra o teatro mais rudimentar, quase circense, pela rapidez da ação e pela proporção relativa dos diálogos. Às vezes a conversa entre as personagens é quase um jogral. Isso não impede que o leitor encontre um esboço de ironia, por assim dizer, pré-machadiana, na conversa do Sr. Almeida – espécie de anjo-da-guarda do protagonista, com um militar reformado: o reumatismo de um e a ferida do outro “se achavam perfeitamente de acordo”, diz o narrador, na opinião de que era necessário eliminar os morros do Rio de Janeiro.
Como essa passagem é absolutamente uma exceção, predominando nas falas do narrador e das personagens os mais surrados estereótipos do Romantismo, vamos ao enredo, que consiste no seguinte.
Jorge é um rico herdeiro que, depois de levar vida boêmia e perdulária, se apaixona pela adolescente Carolina e resolve mudar de vida. Na véspera do casamento de ambos o Sr. Almeida, responsável pelos negócios de Jorge, comunica ao noivo que ele estava pobre e arruinara o nome de seu pai deixando de pagar-lhe as dívidas. O moço se casa, narcotiza a noiva na noite de núpcias e resolve se matar, sendo disso impedido por Almeida. A conselho deste, simula um suicídio e foge para os Estados Unidos, onde reúne o capital necessário para voltar ao Brasil como negociante. Em seu retorno, adota identidade falsa e, depois de resgatar todas promissórias, apresenta-se à viuvinha virgem na forma de um misterioso vulto por quem ela se apaixona. Depois de um parco suspense, os jovens se reconhecem e finalmente o casamento, como se dizia outrora, é “consumado”. Pronto, felizes para sempre. Horrível, não? Isso é tudo.

Eloésio Paulo

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