Vila dos Confins
Crônica regionalista redime o primeiro romance de Mário Palmério
Livro
que, segundo o próprio autor, “nasceu relatório, cresceu crônica e acabou
romance”, Vila dos confins (1956) se
apresenta ao leitor como um composto em que os três gêneros compõem um todo
harmônico. Avultam, como elementos que justificam os elogios obtidos pela obra
de Mário Palmério, o retrato da paisagem regional e, principalmente, a
reconstituição do falar sertanejo.
Quanto
ao relatório, é em torno dele que se constitui o tronco principal do enredo.
Mário Palmério foi deputado federal por Minas Gerais, nos anos 1950, em duas
legislaturas, e sem dúvida é na condição de reminiscência eleitoral que entra
em Vila dos confins o relato de uma
eleição municipal no interior mineiro. Os topônimos são fictícios, mas a
descrição dos tipos humanos bate com os arredores do Triângulo Mineiro, onde
Palmério se fez escritor e, posteriormente, grande empresário da educação
superior.
O
enredo, por sinal, é a parte fraca do romance. Salva-o um desfecho bastante
surpreendente, capitaneado pelo caixeiro-viajante Xixi Piriá, até então figura
totalmente secundária na economia narrativa. A terceira parte do livro é quase
toda ocupada pela crônica da primeira eleição municipal em Vila dos Confins,
disputada pelo coronelão Chico Belo e por João Soares, este aliado ao deputado
Paulo Santos, protagonista e possível alter
ego do escritor.
Ainda
bem que os dois terços restantes são compostos de outra crônica, esta relativa
aos costumes e ao falar sertanejo. Essa parte mais substancial do livro parece
apenas preparar o cenário em que ocorrerá a eleição, mas é a que o justifica
como obra literária. Aí é que o narrador fala das pescarias de Paulo Santos, da
aventura amorosa afinal frustrada com Maria da Penha, jovem e fogosa viúva, de
certos tipos regionais como o caboclo preguiçoso e das táticas do urubu para
iludir seus perseguidores humanos e se apoderar dos restos de uma rês.
Apesar
do desfecho melancólico da eleição, a que se seguem um naufrágio e uma vingança
catártica (para o próprio escritor, talvez, mais do que para qualquer leitor),
fica da leitura de Vila dos confins
uma impressão saudosista que, em certa passagem, é prefigurada por uma fala do
personagem Nequinha Capador: “Naquele tempo havia certa poesia em tudo...”. É
por essa poesia, que consiste em retratar modos de viver e de falar já
virtualmente extintos, que vale a pena ler o primeiro romance de Mário
Palmério.
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